A guerra não tem rosto de mulher Companhia das Letras

A força das mulheres e o lado humano da guerra

11:30Isabela Lapa


A primeira vez que eu vi A guerra não tem rosto de mulher, de Svetlana Aleksiévitch, foi em uma livraria que fica dentro da UMFG. Na hora, o título e a capa me chamaram atenção e eu fiz o que costumo fazer: tirei uma foto e postei no instagram do Universo dos Leitores, para saber a opinião dos seguidores.

Quantos elogios, quantos comentários intensos. Isso sem contar as mensagens privadas que algumas pessoas enviaram, com relatos pessoais sobre a relação com o livro e os sentimentos que ele provoca. Foi arrebatador! 

Coloquei o título na lista de espera e comprei na primeira oportunidade que tive. Eu esperava muito, mas confesso que nem em sonhos eu poderia esperar tanto. 

Nessa obra, intensa e reveladora, Svetlana Aleksiévitch apresenta relatos da Segunda Guerra Mundial sob o ponto de vista das mulheres. Nós estamos tão acostumados a conhecer a guerra pelo olhar dos homens, que muitas vezes nos esquecemos o quanto esses difíceis momentos históricos impactam na vida e na trajetória das mulheres.

Logo no início, me surpreendi quando a autora disse que o que ela queria era a história, apenas a história. E continuou:

"Não estou escrevendo sobre a guerra, mas sobre o ser humano na guerra. Não estou escrevendo a história de uma guerra, mas a história dos sentimentos. Sou uma historiadora da alma. Por um lado, investigo o ser humano concreto, que viveu em um tempo concreto e que participou de acontecimentos concretos; por outro, preciso distinguir neles o ser humano eterno. A vibração da eternidade. Aquilo que sempre existe no ser humano." 

Posso dizer que ela atingiu muito bem o objetivo porque o livro tem alma. Tem dor, tem amor, tem solidão, tem experiências e tem uma sinceridade tão grande, que é necessário respirar antes de virar cada uma das páginas.

Com textos soltos, reunidos a partir de milhares de entrevistas realizadas com mulheres que viveram na gerra, o livro nos conta a vida de médicas, enfermeiras, atiradoras, lavadeiras, telefonistas, cozinheiras, mensageiras etc.

As mulheres tinham diversas atividades na guerra, mas independente da relevância de cada uma delas, a verdade é que elas nunca tinham voz, não eram respeitadas, não eram vistas como seres humanos. 

E nesse livro, de maneira única e envolvente, conseguimos mergulhar na dor e na experiência de várias mulheres, o que nos permite olhar para a história de forma diferente. Algumas se identificaram, outras preferiram o anonimato, mas a verdade é que de um jeito ou de outro, todas tiveram muita coragem.

Relatar momentos tão dolorosos e reavivar lembranças tão difíceis não é uma tarefa fácil. E o mérito da obra reside nisso: na intensidade de cada uma dessas memórias e na forma única com a qual a autora conseguiu transcrever cada uma delas.

Os temas giram entre relações de amor durante a guerra, abusos de poder, cotidiano no front, a angústia interminável da espera, a realidade das mulheres no campo de batalha, a ansiedade pela vitória e a vida pós guerra. 

Nas pequenas vezes em que aparece em primeira pessoa, fica clara a emoção que sentiu ao longo do trabalho e quanto aprendeu com ele. Isso é lindo e revela a importância de um trabalho jornalístico bem feito, executado com cuidado e com respeito às pessoas que foram peça chave para o conteúdo.

"... A memória delas surpreendentemente (já tinham se passado quarenta anos) guardava uma grande quantidade de coisas banais do cotidiano na guerra. Detalhes, nuances, cores e sons. No mundo delas, cotidiano e existência se uniam, e o fluxo da existência era valioso em si mesmo, elas se lembravam da guerra como uma época da vida. Não tanto das ações, mas da vida, e mais uma vez observei como nas conversas delas o pequeno vencia o grande e até a história."

Uma coisa que chama atenção ao longo da leitura é que as mulheres, mesmo em meio à guerra, davam importância à beleza e se preocupavam com o corpo, a aparência e a sobrancelha. Elas tentavam cultivar o feminino e a delicadeza em meio ao caos.

Também é interessante perceber que enquanto para os homens a vitória sempre era vista como heroísmo e como motivo para comemorar, para as mulheres esse resultado muitas vezes causava dor e sensação de vazio. Elas não sabiam para onde ir, o que fazer e como experimentar uma vida comum e uma rotina tranquila.

O livro é espetacular e mescla o sofrimento e a beleza de forma ímpar. A escritora, inclusive, venceu o Prêmio Nobel de Literatura no ano de 2015, e foi a 14ª mulher a receber esse prêmio. 

No ano de 2016 ela participou de um evento em São Paulo e falou sobre o seu trabalho. Vale a pena conferir:



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3 comentários

  1. iraldir fagundes09:55

    "As mulheres tinham diversas atividades na guerra, mas independente da relevância de cada uma delas, A VERDADE É QUE ELAS NUNCA TINHAM VOZ, não eram respeitadas, não eram vistas como seres humanos". -
    -Fantástica a frase da escritora, porém, continuo crendo que mesmo não sendo respeitadas, nunca vistas como ser humano, nunca tinham voz, "o grau de civilização de um povo se mede pelo grau de liberdade da mulher", tamanha sua importância e dignidade. Abraços

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  2. Estou lendo esse livro. Surpreendente! Como guerra não faz parte da nossa trajetória no Brasil, nunca tive interesse particular por este esse assunto, sempre posto de lado em minhas leituras. Eis que ganho o livro de presente de meu irmão e esta faceta das mulheres participando tão ativamente da guerra está me tocando profundamente. Leitura excelente!

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  3. "In light of the book 'The Strength of Women and the Human Side of War', the captivating narrative that reveals the resilience and courage of women in conflict contexts stands out. The work offers a unique perspective, humanizing the impacts of war and highlighting the personal experiences of women facing adversity. By highlighting the human side, the book highlights the importance of recognizing the individual stories behind the numbers and statistics, promoting empathy and understanding."
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