Angélia Pina Ann Brashares

Tudo junto e misturado, de Ann Brashares

00:00Angélica Pina


Lila e Robert se casaram e tiveram três filhas: Emma, Quinn e Mattie. Depois de sérios problemas entre eles, se divorciaram. Lila então se casou com Adam, com quem teve um filho, Ray, e Robert se casou com Evie, com quem teve uma filha, Sasha.

Lila e Robert não se suportam e jamais dividem o mesmo ambiente, mas nenhum dos dois abriu mão da casa de férias que possuíam, onde sempre passam o verão, cada qual com sua nova família, em semanas alternadas.

Dito isso, chegamos a Ray e Sasha. Eles estão com 17 anos e, além de dividirem as três meias-irmãs, sempre dividiram o quarto da casa de praia, mas nunca se viram ou estiveram no mesmo lugar ao mesmo tempo.

“Ela dividia, sim, um quarto com ele. E um banheiro, para o bem ou para o mal (mas mais para o mal). Era mais do que isso. Dividia a vida com ele, pelo menos na sua cabeça. Livros e brinquedos e areia nos lençóis. Um zoológico de animais de plástico. Conchas, irmãs, uma vista da lua. Ela não o conhecia, talvez, mas quantas vezes pensava nele? Por quanto tempo vivera naquele quarto, naquela casa, da mesma forma que ele? Antes, Sasha queria conhecê-lo. Ela se imaginava brincando com ele e inventava jogos que pudessem curtir juntos. Tinha uma inveja profunda do fato de as irmãs terem Ray como irmão e ela não.” (página 31)

Embora acostumados com o fato de nunca terem se encontrado, mas, ainda assim, fazer parte da vida um do outro, Ray e Sasha começam a ter mais curiosidade sobre como seria se as coisas fossem diferentes. Então, no último verão, alguns acontecimentos nas famílias acabam cooperando para que a possibilidade de se encontrarem passe a ser uma opção.

A questão é que nenhum deles pode contar com a maturidade e compreensão de seus pais — no caso, a mãe de um e o pai de outro —, que não estão dispostos a baixar a guarda nem por um momento.

“Ray não era seu amigo. Não era seu namorado. Não era seu de forma alguma. Eles não tinham um relacionamento nem jamais teriam. Ainda que dividissem um quarto e ela fingisse que tinham algum vínculo especial, eles não tinham. Ele só existia na cabeça carente dela, e em nenhum outro lugar. Viviam nos lados opostos de um abismo criado por duas pessoas que se odiavam. Assim era e sempre seria. Não havia motivo nem nada a ganhar ao tentar transpor o abismo. Não tinha o menor cabimento querer conhecer a única pessoa no mundo situada além de seus limites.” (página 108)

Em uma narrativa em terceira pessoa, a autora narra momentos diferentes de cada um dos personagens de maneira bem construída e distinta. A estrutura narrativa criada por Ann Brashares permite que o leitor conheça bem cada um dos personagens, todos com características bem marcantes.

Mattie, de 19 anos, é a irmã que ainda está descobrindo sua identidade e precisa lidar com algumas crises. Quinn, a irmã do meio, tem 21 anos e parece ter assumido como responsabilidade encantar todas as pessoas com quem convive e fazer a vida de todos melhor. Ela é uma garota diferente e especial, com peculiaridades interessantes. Emma está com 22 anos e sabe bem o que quer, especialmente no que diz respeito à sua vida sentimental, já que ela está vivendo seu primeiro e grande amor.

“Quinn sabia que o tempo passava de um jeito diferente para ela. Era outra questão. Ela não se orientava pelas horas do dia nem pelos dias da semana. Por muito tempo tinha tentado basear-se nessas unidades, mas elas não lhe davam a sensação de coerência e sequência que davam à maioria das pessoas. O tempo encolhia ou se expandia, avançava devagar ou corria para trás, de acordo com a luminosidade, a estação e o estado de espírito de Quinn. Às vezes ela imaginava que os dias do calendário eram uma série de portas que conduziam de um cômodo a outro. Quinn não passava pelas portas. Não estava nem no prédio. Quando cuidava das plantas, o trabalho era seu relógio. As plantas marcavam o tempo.” (página 185)

Minha experiência com Tudo junto e misturado foi boa, a leitura fluiu bem rápido, a escrita da autora desperta no leitor aquela dificuldade de largar o livro e a curiosidade pelo que virá nas páginas seguintes.

Em alguns momentos, especialmente no início, me senti perdida e precisei recorrer ao resumo das famílias que vem antes do primeiro capítulo para saber quem era filho de quem, irmão de quem e por aí vai. Sim, o título do livro faz todo sentido!

Não bastasse a confusão na construção familiar, a autora deu a cada personagem seus próprios problemas, de forma que a narrativa traz momentos divertidos, complexos, poéticos, tristes e dramáticos, tudo junto e misturado (impossível não utilizar aqui a expressão para descrever a mescla de temas e sentimentos despertados pela história).

O livro é um Young adult bem completo e, embora confuso em alguns momentos, pode servir não apenas para entreter, mas também para despertar reflexões sobre assuntos importantes e emocionar.

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