As areias do Imperador
Cia das Letras
Mulheres de Cinza - As Areias do Imperador, de Mia Couto
00:00Universo dos Leitores
"A diferença entre a Guerra e a Paz é a seguinte: na Guerra, os pobres são os primeiros a serem mortos; na Paz, os probres são os primeiros a morrer. Para nós, mulheres, há ainda uma outra diferença: na Guerra passamos a ser violadas por quem não conhecemos."
Que Mia Couto é um escritor exímio, todos nós já sabemos. Ele escreve com a alma e consegue nos apresentar os problemas da terra e das lutas por territórios e por sobrevivência, ao mesmo tempo em que nos apresenta personagens intensos, sinceros, complexos, humanos e inesquecíveis. Nos seus livros não existe o bem ou o mal, o certo ou o errado. Não existem julgamentos, as pessoas são o que são: imperfeitas.
Nesse livro, que é o primeiro de uma trilogia, Mia Couto narra os acontecimentos do final do século XIX, período em que Moçambique era governado por Ngunguyane, o último líder do Estado de Gaza, que foi o segundo maior império do continente que ficou sobre o comando de um africano.
"A estrada é uma espada. A sua lâmina rasga o corpo da terra. Não tarda que a nossa nação seja um emaranhado de cicatrizes, um mapa feito de tantos golpes que nos orgulharemos mais das feridas que do intacto corpo que ainda conseguirmos salvar."
A história é narrada por dois pontos de vista: Inami e o Sargento Germano. Inami é uma jovem negra, de 15 anos, que é a única da tribo VaChopi que fala português, razão pela qual é intérprete dos soldados que passam pelo local. Repleta de conflitos internos e cada vez mais familiarizada com a cultura dos brancos, a garota passa a questionar quem ela realmente é e qual o seu lugar no mundo. O Sargento Germano, por sua vez, foi enviado de Portugal para a África para lutar e conquistar o território na colônia, contudo, com o tempo, ele começa a se envolver com a região e passa a questionar não só a sua função na gerra, como também o papel de Portugal no conflito.
Inicialmente, a vida de Inami é completamente diferente da do Sargento Germano. Cada um tem as suas dúvidas, os seus problemas e as suas dores. Aos poucos seus caminhos começam a se cruzar e apesar das diferenças étnicas e culturais, um sentimento sincero e bonito começa a surgir entre eles.
“Alguns de nós, humanos, temos esse mesmo destino: falecidos por dentro, e apenas mantidos pela parecença com os vivos que já fomos”.
Ao mesmo tempo em que a narrativa aborda os sentimentos dos personagens e nos torna próximos e íntimos a eles, ela também nos apresenta um resgate histórico de Moçambique, transportando-nos para um passado marcado por guerras, sofrimentos e pobreza. Um passado que talvez diga muito sobre o presente e talvez até sobre o futuro.
Assim como em todos os livros de Mia, a linguagem do livro é poética, as passagens são emocionantes e os neologismos estão presentes a todo tempo. Nessa obra, além de altas doses de realidade, ainda existem pitadas de fantasia que encantam e acalmam o coração.
Uma história linda, que merece destaque. Mais uma surpresa do incomparável Mia Couto!
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