CrĂ­tica Editora RĂ¡dio Londres

Stoner, de John Williams

00:00Universo dos Leitores

Stoner, escrito por John Williams no ano de 1958 e publicado no Brasil pela Editora RĂ¡dio Londres, poderia ter sido apenas mais um entre os diversos livros que eu li esse ano. Poderia, mas nĂ£o foi... Diferente de tudo o que eu imaginava, a histĂ³ria simples, sobre uma vida comum e sem grande feitos, me cativou do inĂ­cio ao fim e se tornou uma das melhores leituras que fiz em 2015.

Como o prĂ³prio tĂ­tulo anuncia, a narrativa gira em torno dos acontecimentos da vida de Stoner, um sujeito simples, que nasceu no campo e foi para a cidade grande quando o seu pai decidiu que ele deveria se formar em uma universidade. Acontece que durante o curso, o nosso protagonista descobre a sua paixĂ£o pela literatura e constata que a ele sĂ³ resta um caminho: se tornar professor! 


"O amor pela literatura, pela lĂ­ngua, pelo mistĂ©rio da mente e do coraĂ§Ă£o, mostrando-se nas pequenas, estranhas e inesperadas combinações de letras e palavras, nos caracteres negros e frios impressos sobre o papel, e aquele amor que escondera como se fosse ilĂ­cito e perigoso começou a expressar-se, hesitantemente a princĂ­pio, depois ousadamente, e por fim orgulhosamente."
É a partir dessa descoberta que a sua vida começa de fato. No momento em que ele encontra uma razĂ£o para viver, uma verdadeira paixĂ£o, ele se permite olhar para o mundo com olhos de um homem, com olhos de uma pessoa que tem algo para amar, algo em que acreditar. Depois disso ele se apaixona por uma bela mulher, se casa, se distancia dos pais, tem uma filha, faz amigos e inimigos, se envolve com uma aluna e enfrenta dia apĂ³s dia, sendo que a maioria desses dias sĂ£o difĂ­ceis e repletos de conflitos (externos e internos). 

Vale destacar que ao longo da narrativa vĂ¡rios personagens interessantes e complexos aparecem. Todos possuem suas peculiaridades, seus erros e seus acertos, se tornando peças essenciais na histĂ³ria. Claro que um grande destaque Ă© dado para Edith, a mulher de Stoner, que ao mesmo tempo em que foi treinada para ser uma mulher perfeita e uma dona de casa impecĂ¡vel, Ă© fria, distante e fechada em um vazio existencial que incomoda e desperta raiva e pena ao mesmo tempo. 

É impossĂ­vel ler essas pĂ¡ginas sem refletir sobre a nossa prĂ³pria vida e o peso das nossas escolhas. Muitas vezes um "sim" muda tudo, mas um "nĂ£o" pode mudar mais ainda. Tem momentos em que enfrentar pode ser necessĂ¡rio, mas em outros, se calar Ă© a melhor saĂ­da. Quando e como decidir, sĂ³ vivendo, sĂ³ sentindo, sĂ³ arriscando. NĂ£o sei dizer se Stoner sempre agiu da melhor maneira ou se acertou em todas as decisões que tomou. Mas posso dizer que ele conseguiu representar todos nĂ³s, seres humanos imperfeitos, incompletos, doloridos e marcados por uma histĂ³ria, uma trajetĂ³ria, algumas lembranças e muitas expectativas. 


"Estava com 42 anos, e nada via pela frente que quisesse desfrutar e pouco para trĂ¡s que valesse lembrar."
É preciso esclarecer que ao mesmo tempo em que Ă© uma pessoa apĂ¡tica, que aceita o que o destino lhe impõe e poucas vezes age com coragem, Stoner carrega algo que remete a uma rasa esperança. Algumas passagens deixam claro que assim como todos nĂ³s, no fundo ele deseja algo a mais, acredita em algo alĂ©m, sĂ³ nĂ£o sabe como fazer para mudar. E Ă© a simplicidade desse protagonista, que se revela de forma tĂ£o Ă­ntima ao leitor, que prende, emociona, confere um tom melancĂ³lico e reflexivo a essa obra que Ă© simplesmente de tirar o fĂ´lego.

A narrativa Ă© fluida, envolvente e em cada capĂ­tulo uma fase da vida do protagonista Ă© apresentada. O escritor nos coloca diante de uma histĂ³ria tĂ£o crĂ­vel, que parece real. Como disse Ian McEwan, e eu nĂ£o me permito discordar, esse livro Ă© "Uma descoberta maravilhosa para todos os amantes da literatura".


"Mas Willian Stoner conhecia a vida de uma maneira que poucos de seus colegas mais jovens podiam compreender. No seu Ă­ntimo, no fundo de sua memĂ³ria, havia o conhecimento das privações, da fome, da resistĂªncia e da dor. Embora ele raramente pensasse nos primeiros anos de sua vida na fazenda em Booneville, sempre mantinha a consciĂªncia do prĂ³prio sangue e da herança de seus ancestrais, cujas vidas foram humildes, duras e estoicas, e cuja Ă©tica lhe impunha oferecer ao mundo cruel rostos inexpressivos, duros e impenetrĂ¡veis."
Mergulhem de cabeça. É possĂ­vel que assim como eu, vocĂªs terminem a leitura sem saber o que dizer! Confesso que quando cheguei no capĂ­tulo Quinze guardei o livro por duas semanas, porque eu simplesmente nĂ£o queria que ele terminasse. Eu simplesmente nĂ£o estava preparada para aceitar o "fim". 


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