"E porque os antigos deuses haviam morrido por inúteis os homens descobriram outros que sempre tinham existido encobertos pela não necessidade."
Quando eu pensava que José Saramago já havia me surpreendido o bastante, percebi que ainda não conhecia o livro "O ano de 1993". O livro que em 2015 completa 40 anos de publicação, traz difere da maioria de seus romances e destaca o ótimo trabalho do escritor se aventurando no gênero fantasia . O romancista português, que é conhecido por sua capacidade quase camaleônica de se comunicar, já publicou ensaios, romances, distopias e até passeou pelo universo infantil.
Desta vez Saramago ousou e provou sua originalidade em uma distópica previsão do ano de 1993. A história traça um futuro hipotético onde os humanos caminham em um mundo devastado e dominado por forças ocultas, que utilizam a violência para manter homens e mulheres sob controle. Animais mecanicamente modificados são utilizados para guardar e aterrorizar as hordas humanas que perambulam sem destino e sem objetivo.
O inimigo é "invisível" e os humanos já não conseguem identificar o que há por trás dos ameaçadores animais mecânicos, permanecendo oprimidos por táticas de guerra que massacram, devastam e violam em favor do governo.
"Todas as calamidades já haviam caído sobre a tribo a ponto de falar da morte com esperança."
Há violência, angústia e medo em meio ao caos, o que impossibilita grandes perspectivas com relação ao futuro. A perda da intimidade, da privacidade, o retorno a hábitos primitivos, e a relação dos humanos com a sexualidade são alguns dos efeitos de tanta repressão.
Entretanto, apesar de todo caos e das baixas perspectivas também há esperança alimentada pelo instinto de sobrevivência.
É interessante observar que Saramago constrói sua história com elementos de épocas bem distintas: máquinas e tecnologia avançada contrastam com a volta do homem às cavernas, em um looping que nos faz refletir sobre o destino da humanidade e a relatividade do tempo, além de nos fazer questionar as "influências invisíveis" às quais estamos submetidos. A linha que separa os humanos de outras espécies torna-se bastante tênue e o homem retorna à hábitos primitivos diante da ausência de referências e da necessidade de sobrevivência.
Vale lembrar que o livro foi escrito pouco depois da Revolução dos Cravos e acaba consagrando-se como uma forte crítica aos regimes ditatoriais e a todo tipo de repressão.
A história, que faz fronteira entre frase e verso, é bastante peculiar e combina situações e personagens inverossímeis. Por isto, apesar das frases curtas e do texto aparentemente simples, não recomendo O Ano de 1933 para um primeiro contato com os livros de Saramago, já que a narrativa peculiar pode dificultar as primeiras impressões sobre as obras escritor. No entanto o livro é um grande presente aos admiradores do vencedor português do Nobel de literatura e certamente agradará aos fãs de fantasia por meio ao cenário apocalíptico singular imaginado por Saramago.
0 comentários
Obrigada por participar do nosso Universo! Seja sempre muito bem vindo...