O livro sobre o qual falarei hoje foi um presente pra mim, no mais amplo sentido da palavra. "A Invenção das Asas" do Selo Paralela foi cedido gentilmente pela Companhia das Letras e já se tornou um dos mais queridos da minha estante.
Tive tantas razões para me apaixonar por este livro que espero vencer o desafio, de conseguir demonstrar um pouco da grandiosidade desta belíssima história criada por Sue Monk Kind.
1803, Charleston
O livro retrata a história de duas garotas: A menina Sarah Grimké, uma genuína representante da aristocracia derivada dos ingleses, cheia de sonhos e ideias incompatíveis com as regras sociais vigentes. Hetty ou "Encrenca"(nome dado pela mãe com o qual a menina se identificava) era uma garota negra que sonhava em libertar-se da escravidão.
O livro retrata a história de duas garotas: A menina Sarah Grimké, uma genuína representante da aristocracia derivada dos ingleses, cheia de sonhos e ideias incompatíveis com as regras sociais vigentes. Hetty ou "Encrenca"(nome dado pela mãe com o qual a menina se identificava) era uma garota negra que sonhava em libertar-se da escravidão.
A história destas duas garotas com vidas aparentemente tão distintas ganha novos contornos quando Sarah é presenteada com a garota escrava no seu 11º aniversário, destinada a ser sua dama de companhia. A celebração se torna um fiasco, seja pelo nervosismo de Hetty que urina no próprio vestido na frente de todos os convidados, seja pela audácia de Sarah que imediatamente recusa o presente em uma ácida afronta à sua família (em especial à sua mãe que fica furiosa e teme pela repercussão do comportamento impetuoso de Sarah).
A partir daí as duas estabelecem uma conexão para toda a vida, firmada por laços de amizade e de fraternidade que crescem a partir da convivência das duas e narrada através desta história de força, sonhos e superação.
Minhas Impressões:
Em uma sociedade patriarcal e escravocrata, atribuía-se à mulher um papel de "coadjuvante" no seio social. Neste modelo as mulheres não tinham poder de decisão ou mesmo liberdade para expressar suas vontades ou pensamentos.
Enquanto aos homens era permitido o exercício de uma profissão, a participação nas atividades políticas, a escolha da futura esposa e a tomada de todas as decisões familiares, as mulheres eram limitadas a se casarem, engravidarem e perpetuarem o "nome" da família, comprometer-se com as atividades domésticas e artesanais, além da completa submissão aos interesses do patriarca, que na infância era representado pela figura do pai até ser substituído pelo marido na fase adulta.
Não é de se estranhar que na literatura existam poucos registros (ou registros com menor destaque) para mulheres mártires ou militantes nas lutas pela abolição.
Sue Monk Kidd foi na contramão da maioria dos escritores que retratam estas lutas: quem tem voz nesta história são as mulheres. Sejam elas fortes, sonhadoras, amarguradas ou corajosas, é delas o ponto de vista da obra.
Isto porque o livro é narrado pelas duas protagonistas: Sarah e Encrenca, que alternam a narrativa em capítulos curtos e dinâmicos, de uma forma bastante envolvente e interessante. Talvez este recurso seja o responsável pela vontade que senti de "devorar" o livro, o que também foi estimulado pela escrita objetiva e deliciosa de Sue.
À despeito do abismo presente entre a condição social das duas amigas, ambas tem que lidar com a falta de liberdade. Encrenca é considerada propriedade da família Grimké, mas os grilhões só prendem seu corpo. Desde pequena a menina é estimulada pela mãe, uma mulher forte que sempre a incentivava a alimentar a liberdade de espírito, enaltecer e preservar sua cultura e seus valores.
Sarah por sua vez era uma garota idealista que sonhava tornar-se jurista e que ensinou sua dama de companhia Encrenca a ler, pagando um alto preço por sua ousadia. Ela foi obrigada a parar de frequentar a biblioteca que tanto adorava e teve que lidar com a rudez de seu pai, por quem sempre teve grande estima. Sarah vivia em uma prisão ideológica, sufocada pelas palavras não ditas e pela abdicação de seus sonhos.
"Gritei porque não pode
evitar, porque meu corpo era pequeno, sem estofo. Gritei para acordar Deus de
sua soneca.”
Encrenca
Entrelançando suas vidas com histórias de muita luta e coragem contra a escravidão, contra o machismo, o moralismo e até mesmo contra o conservadorismo da religião, ambas se tornaram mulheres fortes e determinadas que lutaram cada uma à sua maneira por um ideal de liberdade e igualdade.
Alguns personagens masculinos integram a história: o Juiz Grimké pai de Sarah, Dinamarca, Bonzinho, Tomfry, Israel e outros. Mas são as figuras femininas que destacam: Charlotte, Sarah, Encrenca, Susan e por fim Angelina, irmã de Sarah que aparece em uma fase mais avançada da história e contribui intensamente à luta abolicionista de Sarah.
As duas irmãs lutaram com fervor pela abolição e enfrentaram a difícil missão de serem ouvidas em uma sociedade surda diante de qualquer voz feminina.
Fatos históricos servem como pano de fundo para a narrativa de Sarah e Encrenca, que tem como foco os sentimentos e os conflitos vividos por elas e pelas mulheres com as quais convivem.
As duas irmãs lutaram com fervor pela abolição e enfrentaram a difícil missão de serem ouvidas em uma sociedade surda diante de qualquer voz feminina.
“Como vocês podem pedir
que voltemos aos nossos salões?”, perguntei ficando de pé. “Dar as costas para
nós mesmas e ao nosso próprio sexo?Não queremos que o movimento se divida,
claro que não. Entristeço-me ao pensar a respeito. Mas pouco podemos fazer pelo
escravo enquanto estivermos sob os pés dos homens. Façam o que precisam fazer,
censurem-nos retirem seu apoio,
continuaremos firmes de qualquer maneira. Agora, senhores, gentilmente tirem
seus pés de nossos pescoços!”
Angelina Grimké
Fatos históricos servem como pano de fundo para a narrativa de Sarah e Encrenca, que tem como foco os sentimentos e os conflitos vividos por elas e pelas mulheres com as quais convivem.
Autora e Obra
Sue Monk Kidd é conhecida pelo best-seller A Vida Secreta das Abelhas. A escritora mora em Charleston, cidade onde se passa a história deste último romance.
A Invenção das Asas foi indicado pelo Clube do Livro da Oprah 2014 e vem fazendo um grande sucesso no mercado editoral. Um fator interessante da obra é a minuciosa pesquisa desenvolvida por Sue: ao final ela revela em nota uma série de detalhes sobre a vida das irmãs Grimké, figuras reais conhecidas pela luta em favor da causa abolicionista e que inspiraram o romance. Ela aponta detalhes históricos e indica o que é ficção e o que de fato faz parte dos registros.
Outro ponto interessante é a luta das irmãs no que diz respeito aos direitos das mulheres: ambas abraçaram a causa feminista e sustentaram um forte discurso de igualdade de direitos entre homens e mulheres, o que é revelado no livro. Sarah e Angelina (carinhosamente chamada de Nina) enfrentam o machismo e o preconceito de gênero até mesmo entre os mais esclarecidos abolicionistas.
“A primeira linha que
tinha se construído em minha mente enquanto ouvia os homens tentarem nos
dissuadir: O que quer que seja moralmente correto para um homem fazer é
moralmente correto para uma mulher fazer.”
Sarah Grimké
Todo este cuidado aliado à imensa sensibilidade da autora criou uma fórmula de sucesso, fazendo de A Invenção das Asas um livro intenso e apaixonante. A obra tem ainda belas passagens e uma lição de coragem fantástica. Vale a pena conhecer esta belíssima história!
Ficha Técnica
Título original: The Invention of Wings
Tradução: Flávia Yacubian
Capa: Estúdio Insólito
Páginas:328
Formato: 16.00 x 23.00 cm
Peso: 0.44500 kg
Acabamento:brochura
Lançamento: 27/01/2014
ISBN: 9788565530484
Selo: Paralela
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