Newton Emediato Filho é escritor de vários ensaios sobre a obra de João Guimarães Rosa e outros. Seu conto, "Um Papagaio Palimpséstico", recebeu vários prêmios, entre eles o do Projeto Manuelzão/UFMG e da Menção Honrosa pela Editora Guemanisse, deTeresópolis/RJ.
O escritor também foi premiado no Concurso Guimarães Rosa com o conto "O tempo de um livro", na IV Jornada Guimarães Rosa/UFMG, organizada pela Associação Brasileira de Médicos Escritores.
Participou, ainda, do livroAsgard: A Saga dos Nove Reinos, lançado em 2011 pela Editora Jambô, com o conto "Em Transe".
Atualmente representa a Seccional da Associação Internacional dos Poetas Del Mundo de Minas Gerais. Também é Embaixador Universal da Paz pelo Círculo de Embaixadores Universais da Paz Genebra/Suíça.
Seu livro Todos os Dias de Ontem reúne vinte contos elaborados após sua convivência com as comunidades do Alto Paraopeba. Quanto tempo você ficou por lá? O que mais chamou a sua atenção?
Na verdade, eu passei minha infância e adolescência numa fazenda no interior de Minas Gerais, portanto sempre estive em contato direto com: vaqueiros, tropeiros, candeeiros e trabalhadores rurais. Ao longo dos tempos, fui convivendo e memorizando muitos destes fatos que estão no livro... Outros fatos obviamente fazem parte da ficção... Quando mudei para Belo Horizonte, em virtude de estudos, me afastei por alguns anos. Voltei à região e tive encontros com estes informantes – muitos se tornaram personagens do livro. O tempo que demorou para escrever este livro é quase impossível registrar, porque venho escrevendo e reunindo estes contos ao longo dos anos. O livro é um projeto aprovado no Edital aberto pela Funarte mais cultura e Ministério da Cultura e graças a este prêmio foi possível a concretização dessa obra. Antes, porém, o projeto foi aprovado pela Lei de Incentivo pela Secretaria da Cultura de Minas Gerais por duas vezes e pelo Ministério da Cultura e não consegui nenhuma captação dos recursos financeiros. Tempos mudaram e o que mais me chamou atenção nesta região é que mesmo diante de toda a tecnologia e desenvolvimento econômico brasileiros, muitos habitantes destas comunidades não tiveram acesso à distribuição da renda e da terra. Hábitos e costumes mudaram... Os jovens zarparam para os grandes centros urbanos e muitos arraiais foram dizimados. Assim, muitas famílias ficaram entregues ao abandono, sem qualidade de vida e transporte. A mobilidade rural muito afeta essas famílias. Antes na região do Alto Paraopeba, o trem de passageiros circulava, interligando municípios conhecidos como terra de ninguém... Com o fim deste meio de transporte, estas comunidades ficaram quase incomunicáveis. Algo inacreditável para os dias de hoje...
Nós lemos seu livro e adoramos os contos. Algum deles o cativa de forma especial? Por qual motivo?
Os contos Jabuticabas Noturnas e Viajantes Noturnos estão intrinsecamente ligados ao subjetivismo de coisas que eu vivi. Assim, o registro destes contos citados e outros também, foram escritos com intensa inspiração, lirismo e ludicidade. O conto Os Vaqueiros de Água Limpa foi um encontro real, no final da primeira década do século passado, entre meu avô materno e o poeta solitário de Mariana - Alphonsus de Guimarãens. E meu avô repetiu esta história para mim várias vezes! Eu acredito que para escrever um bom texto literário é necessário sempre mesclar realidade e ficção. E o que digo, muitas vezes, é que o universo que descrevo é um mundo em extinção.
Você se utilizou de um linguajar sertanejo e de algumas expressões típicas da região. Teve dificuldade para mesclar o estilo do povo com o texto formal e claro?
Quando se vive em contato in loco com essas comunidades - fazendas tradicionais e quilombos – o trabalho literário se produz de forma mágica na página em branco. Assim os fatos, sejam eles de qualquer natureza, se unem a inspiração que se desperta teluricamente. Posso dizer que nestes momentos inspirados, uma vez aproveitados, tornam-se mais tarde em escritos inexplicáveis. A empreitada parte dessa observação participante de conviver, habitar, cultuar e tomar conta, para depois assimilar as experiências de vida dessa gente do sertão. Em nossas conversas, muitos casos se repetiram e para isto acontecer, bastávamos que eu provocasse estes encontros... Quanto ao processo de escrita, procurei tecer os contos em prosa poética, recheada de imaginação.
Qual a principal mensagem que você quis passar neste livro?
Todos nós seres humanos temos por obrigação realizar ações positivas para que outras gerações possam sentir orgulhos de nós. Porque a história de um verdadeiro homem de ação pode ser contada num único dia. É bom ressaltar que o homem, seja ele qual for sua classe social ou etnia, ele valerá por seus atos. Qualquer história de vida interessante tem seu valor, seja no passado, no presente ou no futuro.
Na sua opinião, as questões sociais ou de conscientização são essenciais para a construção de um bom livro?
Sem sombra de dúvidas, a história oral existe porque muitas vezes a história oficial não cumpriu com sua função. Então é necessário para o escritor, mesmo sendo ficcionista, buscar sempre a verdade dos fatos acontecidos. A omissão para mim é o fim da etapa humana aqui na terra. O livro tem que fazer o leitor rir e chorar e, sobretudo, extasiado com a narrativa e que ele viaje. Enfim, o leitor quase no fim do livro diminui o ritmo da leitura para que o livro nunca termine. Como diz Guimarães Rosa “o livro vale muito pelo o que nele não pode caber”. Cabe ao leitor informar, discernir e formar sua opinião crítica sobre os escritos.
Antes deste livro, suas obras eram muito influenciadas pelo estilo Guimarães Rosa. O que mais desperta sua atenção nas obras dele? Qual sua obra preferida?
Logo que li as obras deste escritor, identifiquei -me com o sertão mineiro. Tenho muitas afinidades com os sertanejos desde a infância. E o estilo roseano logo me provocou reações indeléveis, como se fosse uma formula química que meu âmago necessitava para poder ler e escrever. As personagens femininas da galeria deste escritor fascinam meu imaginário de forma telúrica. Portanto, não é exausto ler e reler e voltar a ler sempre o volume Corpo de Baile, Sagarana, Tutaméia, Primeiras Estórias e Grande Sertão: Veredas! Minha obra preferida desde autor é, sem dúvida, a que penso ser um romance completo e uma das mais importantes da literatura universal: Grande Sertão: Veredas.
Além dele, algum outro escritor contribuiu ou inspirou o seu trabalho?
Gosto muito de Mario Vargas Llosa, Dostoiévski e Eduardo Galeano. Outros brasileiros também que me influenciam demasiadamente como Graciliano Ramos e João Ubaldo Ribeiro.
Qual escritor atual você indica? E qual livro considera de leitura obrigatória?
Eu admiro Mia Couto, este escritor de Moçambique tornou-se essencial e suas obras primorosas devem ser lidas como: Terra Sonâmbula, O Último voo do Flamingo e outras. Gosto muito de Pedro Páramo do escritor mexicano Juan Rulfo. Este último já li e reli várias vezes.
Qual a sua crônica preferida?
Aquela que ainda não fora escrita. Mas em falar em crônicas a minha mente logo se remete a figura do nosso grande Luís Fernando Veríssimo.
Como e quando decidiu ser escritor?
Quando aos quinze anos de idade tive acesso, sem querer, às obras de João Guimarães Rosa. Fato inacreditável porque não foi indicação de ninguém. Eu simplesmente vi na biblioteca e me interessei. E nunca mais parei de ler... Ademais, nestas bandas do território mineiro o acesso aos bens culturais não é estimulado e há poucas exceções. A partir de minhas leituras de obras de grandes escritores nacionais e internacionais – os clássicos– e, principalmente a minha convivência com as pessoas humildes do sertão me proporcionaram uma mente fértil. Mas escrever no Brasil é muito difícil! Segundo Marcelo Marinho, autor do prefácio do livro Todos os Dias de Ontem, a literatura é um copado de árvore e nós escritores temos que observar os detalhes da vida dos outros. Parece que não há mais nada a escrever... O olhar deve estar atento. Às vezes, é nos acontecimentos mais corriqueiros que habita uma boa história.
Podemos esperar novas obras?
Imagino terminar de escrever mais um romance que está engavetado há anos... Será um romance histórico!
A crítica literária ajuda ou atrapalha?
Quando Guimarães Rosa começou a publicar sua obra genial a crítica não o perdoou. Então, em 1956, quando publica Grande Sertão: Veredas e o volume Corpo de Baile a crítica ainda não perdoou... Mas quando a obra roseana foi lançada em várias nações européias a crítica silenciou. Hoje, estes mesmos críticos abrem a boca até o canto para vangloriar Grande Sertão: Veredas como uma da obras mais importantes da humanidade. Quando a crítica é sincera, eu a agradeço e aprendo muito com ela.
*Já falamos de Todos os Dias de Ontem aqui no blog. Clique aqui para conhecer a obra.
*Já falamos de Todos os Dias de Ontem aqui no blog. Clique aqui para conhecer a obra.
2 comentários
Sensacional...Que delicia conhecer de perto um pouco de você...Amei quero estar sempre por aqui quero conhecer todas as suas obras. Estou compartilhando com meus 999 amigos. Beijoss
ResponderExcluirLi o livro, e gostei! Recomendo em especial para aqueles que apreciam obras sertanejas(sertão). Uma obra perfeita para debulhar sobre o silêncio e a terra de habita em cada de nós! Isa de Oliveira
ResponderExcluirObrigada por participar do nosso Universo! Seja sempre muito bem vindo...